MAURO PIVA Curadoria: Mauro Piva Período: 18 de fevereiro a 22 de julho de 2017 Livre para todos os públicos
Para quem acompanha o trabalho de Mauro Piva, que considero um dos maiores aquarelistas do nosso tempo, a exposição do Instituto Figueiredo Ferraz é uma surpresa.
Não que o artista não nos surpreenda sempre que realiza uma mostra. Conheci o trabalho de Mauro Piva nos anos 90, quando participei de um júri num salão no interior de São Paulo. Fiquei impressionada pela qualidade e originalidade de seus trabalhos. Fiquei muito feliz quando os outros jurados compartilharam esta impressão comigo e todos concordamos em não apenas aprova-lo como também premia-lo.
Na época, Piva realizava aquarelas de personagens, figuras humanas sem rosto, em diferentes situações. Duplas semi apagadas, personagens solitários sempre flutuando em meio ao branco do papel. A identidade era uma das questões mais abordadas por artistas daquela década e Mauro estava sintonizado com seu tempo. Seus personagens, auto retratos e retratos de sua geração ficaram tão conhecidos que tornaram-se sua marca registrada.
Mas Mauro nos surpreendeu logo depois com uma nova série, onde passou a registrar objetos de seu cotidiano de artista como lapiseiras e pincéis, buscando uma nova forma de se auto retratar. Esta pesquisa teve continuidade com a série que surgiu em seguida, onde passou a “retratar” através da representação em pintura de fitas crepe, papéis e post-its; obras de outros artistas como Mondrian, Oiticica e Clark. As “reproduções” trazem um novo olhar por meio de uma fatura irrepreensível. Apenas os espectadores muito atentos conseguem notar como as obras são realizadas.
Essa pesquisa da representação de si mesmo e de outros artistas tornou-se quase uma obsessão para o artista, que passou a trabalhar a partir de testes de cores seus e de outros artistas. Ora, a cor é o elemento principal na aquarela, e quase todos os artistas realizam diversos testes de cores antes de imprimirem as pinceladas definitivas nas obras. O próprio Mauro Piva tem essa prática em seus trabalhos, conforme podemos constatar nas áreas que circundam suas aquarelas, onde diversas pinceladas buscam a cor ideal para cada detalhe do trabalho. Assim, surgiu a série de reproduções de testes de cores de artistas que vão de Albrecht Dürer à Josef Albers, passando pelo próprio Mauro Piva. Novamente, antenado ao seu tempo, Mauro realiza trabalhos que são minuciosos “retratos” de outros artistas e de si próprio, enganando o olhar do espectador. Vivemos numa época em que realidade e ficção se misturam, real é virtual. Mauro se vale de imagens captadas pelo celular ou por meio da internet e, utilizando uma técnica milenar e que exige muito tempo e riqueza de detalhes, reproduz “cópias fiéis” (1), que são, na verdade, originais. Originais de Mauro Piva.
A mostra apresentada no IFF mostra uma série dessas aquarelas realizadas a partir de estudos de aquarelas, ou seja, reproduções de estudos feitos para uma outra série também aqui exposta: a das “joaninhas”, como Mauro a intitula. As joaninhas aqui retratadas invadiram o pequeno jardim localizado nos fundos de seu ateliê, quando este se mudou para lá e passaram a fazer parte do dia a dia do artista. Mas um dia elas sumiram por conta de um tratamento que foi feito para as plantas. Mauro, então, resolveu retrata-las a partir de fotos que tirava quando recebia suas “visitas”. Mas isso não era suficiente... Então, ele resolveu reproduzi-las em pequenas esculturas de madeira e dispô-las nas paredes do ateliê. Como o artista me confessou: “A presença das joaninhas me fazia bem, não por acreditar que elas me traziam sorte ou alegria, mas porque agiam como catalisadoras de boas energias. Olhar as joaninhas, me lembrava de que dentro de nós existe o poder de nos fazermos sentir bem. O poder de sermos felizes.” Esta é a surpresa desta mostra. Uma série de trabalhos intimistas, muito pessoais do artista. Eu a descobri em seu ateliê e fiquei surpreendida, como da primeira vez que vi seu trabalho há muitos anos atrás. Espero que vocês também se surpreendam com a delicadeza e sutileza destas obras.
Rejane Cintrão
(1) parafraseando Camila Molina em matéria escrita para O Estado de São Paulo sobre o artista, em 10/07/2016.
Todo um processo (joaninha, registros e testes de cores), 2016 Acrílica, aquarela, guache, lápis de cor e nanquim sobre papel. Dimensões variadas - políptico de 15 peças
In Hortum Meum 7, 2014 Aquarela e lápis de cor sobre papel. 12,4 x 9,5 cm
Rua Maestro Ignácio Stábile, 200 | Alto da Boa Vista | Ribeirão Preto | SP | Brasil